Mônica Rodrigues da CostaLiteratura – Mônica Rodrigues da Costa http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br Comentários culturais para crianças e adultos lerem juntos Mon, 18 Nov 2013 13:23:01 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 O que o escritor Isaac Bashevis Singer falou sobre o modo de ler das crianças http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/2012/04/18/o-que-o-escritor-isaac-bashevis-singer-falou-sobre-o-modo-de-ler-das-criancas/ http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/2012/04/18/o-que-o-escritor-isaac-bashevis-singer-falou-sobre-o-modo-de-ler-das-criancas/#respond Wed, 18 Apr 2012 17:46:57 +0000 http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/?p=815 Continue lendo →]]> Em seu discurso ao receber o Prêmio Nobel de Literatura, em 1978, Isaac Bashevis Singer (foto) enumerou dez razões sobre os motivos pelos quais ele escrevia para crianças:

1. As crianças leem livros, não leem resenhas. Elas não dão bola para críticas literárias.

2. As crianças não leem para descobrir a própria identidade.

3. Elas não leem para se livrar de culpas, para saciar a sede por rebeliões ou superar a alienação.

4. Elas acham inútil a psicologia.

5. Elas detestam sociologia.

6. Elas não tentam entender Kafka ou “Finnegans Wake” [livro de James Joyce].

7. Elas ainda acreditam em Deus, na família, em anjos, demônios, bruxas, gnomos, lógica, clareza de estilo, pontuação e outras coisas obsoletas como essas.

8. Elas amam histórias interessantes, não amam explicações, guias ou notas de rodapé.

9. Quando um livro é entediante, elas bocejam com franqueza, sem qualquer culpa ou medo da autoridade.

10. Elas não esperam que seu escritor preferido salve a humanidade. Jovens como são, elas sabem que isso não está ao alcance dele. Somente os adultos têm esse tipo de ilusão infantil.

 Leia em inglês no link:

http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/literature/laureates/1978/singer-speech.html

 

A editora Topbooks publicou em 2009, de Singer, “Histórias Para Crianças (de 1985).

Link: http://www.topbooks.com.br/sinopses.asp?topico=%20%DAltimos%20Lan%E7amentos&item=14&tabela=Topbo02

 O físico Fábio Freitas me enviou o trecho acima do discurso de Singer. Freitas é professor no Instituto de Física da UFBA (Universidade Federal da Bahia) e doutorando em história da física pela UFBA e pela Universidade Estadual de Feira de Santana (BA).

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Lobisomem e laboratório de biogenética se combinam em romance de aventura http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/2012/04/13/lobisomem-e-laboratorio-de-biogenetica-se-combinam-em-romance-de-aventura/ http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/2012/04/13/lobisomem-e-laboratorio-de-biogenetica-se-combinam-em-romance-de-aventura/#comments Fri, 13 Apr 2012 14:32:31 +0000 http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/?p=801 Continue lendo →]]>

Ilustração de Kipper

“Armadilha para Lobisomem” não serve para ninar e assustar criancinhas quando o homem esquisito da lenda pula para a floresta virando lobo em noite de lua cheia. Esse livro, do Luiz Roberto Guedes, traz  trama complexa e pós-moderna.

Uma empresa transnacional, corrupta, tem um escritório numa cidade local, São Luís, no Maranhão, e cerca a fera brasílica para sequestrar seu código genético. A armadilha tem olhos verdes e se envereda por uma história de amor.

Tráfico de genes, plantas híbridas que rendem milhões de dólares, captura de lobisomem a qualquer preço. Um mundo fora da ética, repleto de gângsteres.

Tudo porque o livro conta a história das Organizações Platino, que criaram a Orchidea platina, nova espécie derivada de um gene de água-viva que os cientistas do chamado “Império Platino” “insertaram” numa orquídea.

A planta luminosa virou mania planetária. Deu ideia de outros seres – e mais lucro a essa empresa, ainda conhecida como o Laboratório BioPlatek.

Esse ninho de cobras criou seres que mereciam estar expostos num circo: Zebrelho (coelho combinado a zebra), Goldina (galinha que põe ovos dourados), Octo-Plux (minipolvo fluorescente).

Então será a vez de explorar o lobisomem. Acharam esqueleto de criatura esquisita na Chapada do Araripe, com ossos atravessados por bala de prata, o que é típico da lenda do homem que vira cachorro-do-mato.

Guedes compõe metáforas mirabolantes e peripécias de arrepiar os cabelos. Mistura poesia, arqueologia, genética, política, cultura pop.

Só o personagem do lobisomem rende um blog inteiro. O monstro foi descrito de forma inesquecível pelo escritor José Lins do Rego (1901-1957).

O lobisomem de Guedes vive em um romance de mistério e suspense, de leitura veloz. O melhor da história está nas pistas, nas entrelinhas. 

O paulistano Guedes domina o jogo de palavras, a paródia, a ironia e a arte de narrar. Escreve um enredo com a técnica da intertextualidade.

Remete o leitor para o cinema de Indiana Jones e de ação, para a MPB, para cenas da literatura, para o imaginário brasileiro.

Quem tem 11 anos vai usufruir de “Armadilha para Lobisomem” (184 páginas).

Guedes parodia o próprio gênero de literatura de aventura e suspense que usa para escrever. No meio da narrativa mitológica, insere o retrato da vida contemporânea.

A pior parte: cinismo, corrupção, corrida desenfreada pelo lucro.

A melhor: avanços científicos, conscientização sobre o ambiente e limites de crescimento, referências, literárias ou não, para o leitor decifrar.

Não precisa dizer que esse livro é um prato-cheio para professores de biologia e de português, redação, comunicação e expressão.

As ilustrações são de Henrique Kipper (fotos).

Da Cortez Editora. A atual edição está no padrão da nova ortografia, segundo Guedes (em vigor a partir de 2013).

Link:

http://www.cortezeditora.com.br/DetalheProduto.aspx?ProdutoId=%7B3FBD5BBC-D7B3-E011-955F-842B2B1656E4%7D

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Palavras sobre as poéticas de Arnaldo Antunes http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/2012/03/26/palavras-sobre-as-poeticas-de-arnaldo-antunes/ http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/2012/03/26/palavras-sobre-as-poeticas-de-arnaldo-antunes/#comments Mon, 26 Mar 2012 10:55:55 +0000 http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/?p=490 Continue lendo →]]> O artista multimídia -está mais na moda o termo “transmídia”- Arnaldo Antunes, do palco, do rock, da MPB e da literatura, com CDs, livros, vídeos e filmes, DVDs, cartazes e instalações, explora os suportes que veiculam palavra, som, voz, imagens, grafismos. Manipula códigos e linguagens. Realiza poéticas que se estendem de uma mídia para outra e subverte sentidos.

Dialoga com as linguagens de ruptura das vanguardas históricas -final do século 19 até anos de 1950- e retoma o fio de Ariadne da literatura em seu curso no tempo.

Falar o canto e cantar o verso

Desde o livro “Psia” (Expressão, 1986), apresenta esse modo de narrativas múltiplas. Ícones pops e palavras de ordem se desautomatizam, o poeta devolve os signos urbanos a quem passa na rua ou vai ao cinema.

 “n.d.a.”, título de seu livro mais recente, é anagrama ou espelho de “DNA” e “nada” e experimentação ao estilo de Duchamp.

Antunes fez certos poemas da forma como as trepadeiras ocupam as paredes do jardim. 

Poema "Crescer"

“n.d.a” (Iluminuras, 2010) parece explorar em vários poemas o procedimento probabilístico de Marcel Duchamp. Mistura linguagens ao produzir poemas gráficos, como os da série de mãos pré-fabricadas, um trocadilho com “hand-made”. A mão-coisa que se faz e desfaz faz parte do homem-coisa e do nome das coisas, objeto de sua arte.

Nos poemas fotográficos, “ready-mades”, achados poéticos falam “das coisas como são”.

 

Capa do livro de Arnaldo Antunes

Tradição

Sua linguagem dialoga com a tradição e com a vanguarda, da poesia concreta, do tropicalismo, da pop art. Relaciona-se com Cummings, Joyce, Cabral, Drummond.

A obra de Arnaldo Antunes está composta por uma linguagem que  representa o Homo semioticus no dizer do poeta Décio Pignatari. Isso quer dizer que o ser humano é sua própria representação em signos, em linguagens das mídias impressa, televisiva e da web, com as quais se lida na trilha sonora do cotidiano, no ofício diário dos escritórios e nos cruzamentos das ruas.

Ao mesmo tempo, intimidade com o sentido. Além da forma plástica, o poeta reformula as próprias “fôrmas” com que modula signos gráficos. É o caso de “ABC”.

Link: http://www.youtube.com/watch?v=B9kUUsqEawY&feature=related

 

A poesia de Antunes é pós-industrial, pós-natureza, uma ironia à era da manipulação do DNA.

Para o filósofo Slavoj Zizek, a ameaça biogenética é uma versão nova e muito mais radical do fim da história que mina os próprios fundamentos da democracia liberal, os avanços científicos e tornam obsoleto o sujeito liberal-democrata livre e autônomo.

Arnaldo Antunes toca neste ponto com suas poéticas.

 Quando põe em cheque a expressão “DNA” e sua relação com a palavra nada, a poesia de Arnaldo Antunes contrapõe-se ao autômato que Zizek afirma que é no que o homem está prestes a se transformar.

Como poesia é mistério, há a chance de resultar em “nenhuma das [respostas] anteriores”.

 

Link da Iluminuras: http://www.iluminuras.com.br/v1/

 

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Livro “Roça Barroca” renova repertório poético e adiciona histórias ao imaginário americano http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/2012/03/22/livro-roca-barroca-renova-repertorio-poetico-e-adiciona-historias-ao-imaginario-americano/ http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/2012/03/22/livro-roca-barroca-renova-repertorio-poetico-e-adiciona-historias-ao-imaginario-americano/#respond Thu, 22 Mar 2012 12:00:18 +0000 http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/?p=453 Continue lendo →]]>

Sobre a foto acima, consta no arquivo da Folha: “Casa da aldeia Peguaoty, situada dentro do parque Intervales; construída de madeira e palha, edificação segue a tradição guarani”/ Bruno Miranda/Folha Imagem, 2006

 

O livro “Roça Barroca”, de Josely Vianna Baptista, se divide em duas partes. Na primeira, que é bilíngue, a tradutora e pesquisadora transcria o mito guarani “Mbya” de origem do mundo.

“Mbya” é um dialeto guarani.

Na segunda parte do livro, “Moradas Nômades”, a poeta, autora de “Poros Flóridos”, mostra poemas que criou a partir da experiência entre os guaranis que visitou quando realizava estudos para compor esse “Roça Barroca”. Criou-os também inspirada na melodia da linguagem, no fluxo onomatopaico, nos truques das quebras de versos.

Na primeira, a cosmogonia guarani é uma narrativa poética, ou seja, história repleta de imagens, ou metáforas, no meio da narrativa, com passagens apresentadas apenas por justaposição.

O mito é uma narrativa que pertence ao campo da poesia, já que procura formas análogas para descrever o mundo, as relações entre bicho, gente, planta.

Esse tipo de pensamento expresso pela forma de narrar do mito é conhecido como “pensamento sensível”, oposto ao racional linear.

No caso desse mito da criação do mundo, a palavra poética expande seu potencial significante porque é o centro da origem e da religião guaranis.

Segundo a pesquisadora, o mito foi coletado por León Cadogan (1899-1973) entre os Mbyá-Guarani do Guairá, no Paraguai, nos anos 40. São os cantos míticos “Ayvu rapyta’’, que os guaranis repetem em rituais religiosos.

Os cantos são “as primeiras palavras inspiradas”, que os índios guardavam em segredo.

Para eles, o deus dos guaranis, iluminado por seu próprio coração, desdobrou-se de si mesmo abrindo-se em flor. Em outro desdobramento de si mesmo, o deus supremo criou a palavra-alma.

Para Josely Vianna Baptista, os principais conceitos da cosmologia /[cosmogonia] guarani são três.

O primeiro, “os primitivos ritos do Colibri” (“Maino i reko ypykue”), revela o momento da criação, quando tudo era o caos e só havia o pio da coruja sarapintada.

O colibri, “em adejos sobre a fronte do deus, farta de flores, respinga água em sua boca e o alimenta com frutos do paraíso”.

A explicação da autora é em si própria um poema paronomásico, rico em semelhanças sonoras, que dão ritmo à historia.

O segundo conceito origina-se do canto “A fonte da fala” (Ayvu rapyta). É o momento em que o deus “desdobra de si o fulgor do fogo e a neblina que dá vida, a fonte do amor e do som sagrado”.

A fala “aflora” do deus, tem origem divina e por isso é sagrada. Depois vêm “os homens e as mulheres que iriam refletir sua divindade”.

São eles Ñamandu de Grande Coração, Karaí, Jakaira e Tupã, “pais e mães da palavra inspirada que insuflará a alma em seus filhos futuros”.

O terceiro conceito está no canto “Yvy tenonde”, “A Primeira Terra”, que o deus cria com a ponta de seu bastão, junto com sete céus e suas escoras, que são as palmeiras azuis, e com os primeiros animais da Terra.

Então o deus sussurra aos seus o “canto sagrado”, que faz a comunicação entre o divino e o humano.

Josely Vianna Baptista realizou uma grande pesquisa, desde a etnografia, quando visitou uma comunidade guarani, até os estudos linguísticos e poéticos para a tradução.

Um dos principais informantes nessa etnografia, relata Josely Vianna, foi Teodoro Tupã Alves, liderança indígena e professor na aldeia de Ocoy, em São Miguel do Iguaçu, no Paraná.

Capa do livro de Josely Baptista

 Link da editora: http://editora.cosacnaify.com.br/ObraSinopse/11641/Roça-barroca.aspx

Para conhecer mais sobre os guaranis, siga o link do Instituto Socioambiental (ISA):

http://pib.socioambiental.org/pt/povo/guarani

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Livro “Retornar com os Pássaros” funde poesia e prosa http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/2012/03/12/livro-retornar-com-os-passaros-funde-poesia-e-prosa/ http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/2012/03/12/livro-retornar-com-os-passaros-funde-poesia-e-prosa/#comments Mon, 12 Mar 2012 14:30:33 +0000 http://monicarodriguesdacosta.blogfolha.uol.com.br/?p=290 Continue lendo →]]>

Capa de “Retornar com os Pássaros”, de Pedro Maciel (ed. LeYa)

“Retornar com os Pássaros”, de Pedro Maciel (ed. LeYa, 2010), é uma espécie de alegoria do voo, no sentido metafórico, e percorre um voo, no sentido físico. Prova disso são as ideias que são retomadas de um capítulo para o outro, em geral nos títulos, fazendo o pensamento saltar para o capítulo anterior para então prosseguir e, assim ou por isso, o leitor realiza uma leitura sempre circular.

Pode-se dizer também que essa organização toma emprestada a construção musical, com o retorno do tema, mas de um modo “desconstruído” (fragmentário), como na música contemporânea.

Esse terceiro livro de Pedro Maciel confirma a realização de uma nova forma de narrar na língua portuguesa, que se encaixa perfeitamente no tempo exíguo que existe no presente, digital e instantâneo, em que o trabalho solicita todas as horas.

“Retornar com os Pássaros” foi antecedido por “A Hora dos Náufragos” (ed. Bertrand Brasil, 2006) e “Como Deixei de ser Deus” (ed. Topbooks, 2009). O trabalho de Maciel é elogiado por escritores e críticos como Ferreira Gullar e Ivo Barroso.

O estilo de Pedro Maciel atrai o leitor como um ímã, como diz a canção. É impossível parar de ler e, ao final, permanece aquela saudade e tristeza porque a história acabou.

O mais intrigante, porém, é que não existe um desenho tradicional no enredo, pois o personagem-narrador tem uma origem misteriosa e um percurso enigmático.

Vê o mundo de fora e trata o sonho como realidade ou vice-versa. A ação é joyciana, acontece na mente do protagonista. Já o tempo é woolfiano, pois nunca passa e nunca para de passar. Sua prosódia é singular, única.

Impressiona a proximidade com a filosofia e a astronomia. Não há como não pensar no livro “Poética”, de Aristóteles, quando o filósofo grego descreve o conteúdo dos gêneros e discorre sobre a construção do pensamento.

As presenças de Nietzsche e Cioran se revelam aqui e ali no tom profético de certas afirmações sobre a humana sina de viver.

Ecos de Dostoiévski e Beckett confirmam-se em considerações sobre o nada e a existência. A psicanálise fenomenológica de Bachelard pode ser lida nas entrelinhas sobre a natureza dos materiais que são objetos do autor-narrador.

Todas as camadas do gênero romance são postas em cheque. O jogo pronominal questiona a função do protagonista.

O eu-narrador autodestitui-se logo no início –“Eu nem sempre quer dizer eu mesmo”– e conduz a reflexão do leitor, que se depara com “insights” ou revelações poéticas.

Confunde-se com um “ele” misterioso e inclui o leitor na narrativa. Última coisa: o especial de “Retornar com os Pássaros”, com sua ambiguidade e ironia constitutivas, é pensar o estar no mundo dentro e fora do que se compreende como humanidade, num jogo inteligente entre a física e a metafísica.

A literatura de Pedro Maciel tem desdobramentos múltiplos e surpreendentes. Há muitos aspectos a explorar e muito a dizer sobre esse livro. 

Seguem dois capítulos de “Retornar com os Pássaros”, de Pedro Maciel:

“Terra, Ar e Água”

“(…): não imagino onde estarei quando não mais estiver por aqui. ‘Amanhã fica pra amanhã. Há dias que perdi a noção do tempo. Onde é o dentro do tempo ou o centro do espaço?’ Eu volto com frequencia a certos lugares quando o tempo avança em cima da hora. Eu sempre perco a hora no último momento. Somos o tempo, diz o meu avô. ‘Às vezes tenho vontade de voar para outro espaço, como fez Perseu’. ‘Não há maior maravilha que vagar pelas alturas estelares, deixar as regiões sem encanto desta Terra, cavalgar as nuvens, alçar-se aos ombros de Atlas, e ver lá longe, lá embaixo, as diminutas figuras a moverem-se sem rumo, sem razão, aflitas, temendo a morte, e aconselhá-las a fazer do destino um livro aberto’.”

“Não me Restava Muito Tempo”

“A última vez que a encontrei, ela implorou-me para que não a abandonasse. Talvez ela ainda viva naquela casa azul e branca; o passeio lateral da casa estava sempre manchado de um vermelho carmim, um roxo amarelado pelo Sol. De madrugada escutávamos as amoras em linha reta despencarem no chão. Por amor perdemos a razão. ‘Há sempre alguma loucura no amor. Mas há sempre, também, uma razão na loucura’. ‘O amor é uma neurotoxina; pode danificar irreparavelmente o sistema nervoso central, se não formos ‘correspondidos’. Um dos sintomas associados à superexposição do amor é a cegueira’. ‘No amor basta uma noite para fazer de um homem um deus’. ‘Raramente um sentimento está tão predestinado a criar coisas nefastas e, ao mesmo tempo, maravilhosas’. ‘Pode-se dizer também que o amor é como aquela que no céu denominamos Via Láctea, um amontoado brilhante formado de pequenas estrelas, cada uma das quais muitas vezes é uma nebulosa’.”

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